O Mito dos Saberes Inúteis

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Certa vez um padre foi visitar uma tribo de índios e durante o caminho de volta ficou se gabando sobre o seu grande conhecimento e sabedoria. Ele comentou que a tribo do índio que dirigia a embarcação era ignorante e para provar perguntou se o índio falava outra língua. O índio respondeu que não e que para ele somente era interessante entender a língua do povo dele. O padre disse que isso era um símbolo de ignorância e que aprendeu a falar latim e italiano. O padre perguntou quantos livros ele havia lido. O índio respondeu que nenhum, pois todas as lendas eram passadas em canções ou contadas em uma roda de fogueira. O padre retrucou que os livros tornavam uma pessoa culta e inteligente e que ele lia um toda semana. O padre continuou a falar sobre como era importante saber sobre botânica, astronomia etc. O índio, com um ar simpático e calmo, perguntou se o padre sabia nadar, pois todos os índios aprendiam isso desde pequeno. O padre lhe disse que não, que jamais havia perdido o tempo dele com besteiras. O índio, sereno e tranquilo, falou que isso era uma pena, pois o barco estava afundando e neste momento nadar era a única coisa importante.
Vivemos em um tempo curioso. Nunca o homem dependeu tanto de conhecimentos diferentes. Nunca se fez tão necessário conhecer e ter ideias sobre o mundo a partir de perspectivas diferentes. E nunca nós valorizamos tanto uma só forma de aprender, saber e olhar as coisas. É só pensarmos um pouco em como fomos educados. Uma minoria de nós estudou teatro, “ballet”, música, canto ou pintura da mesma forma que estudou matemática. Sabemos que o quadrado da hipotenusa é a soma do quadrado dos catetos, mas não sabemos o porquê de dançarmos, pintarmos, cantarmos e de nos mexermos tanto. Não sabemos como se deu a história da música brasileira, ou nunca assistimos a uma apresentação de dança. Quantos de nós tivemos contato com outra realidade que não a nossa? Não quero dizer com isso que matemática não seja importante, ela é, para alguém é interessante que saiba tudo sobre geometria, mas quem disse que saber dançar é inútil? Aliás, deveria ser um erro de português falarmos a palavra saber junto com mais, menos ou inútil. Alguém ai sabe de algo, de algum saber, que não seja importante para ninguém?
Aliás, palavra interessante essa. Li outro dia que conhecimento sem experiência, não é um saber é só um refúgio para a ignorância. Infelizmente, nossa forma de avaliar e de ensinar não valoriza muito as experiências. Quase não saímos da sala de aula, e na faculdade, quando estamos fora dela, pensamos na prova que iremos fazer dentro dela. É como se tivéssemos aula de natação, mas nunca tivéssemos visto o mar. Creio que o nosso padre teria se afogado.
O mundo é colorido, mas nós o aprendemos em preto e branco.
Assim como Darwin notou que a economia da natureza possui espaços a serem preenchidos, a nossa sociedade carece de uma gama muito grande de saberes para que possa resolver os problemas que a afligem. Esses saberes devem ser aprendidos através da experiência. Precisamos conhecer a sociedade, não olhar uma foto de um garotinho desnutrido em um livro e achar que conhecemos a pobreza, ou pior, achar que lamentar a foto irá aliviar a dor da fome. Isso é tão útil para o garoto, quanto uma foto da molécula de oxigênio para quem morre asfixiado. Somente com a experiência entraremos em contato com as mais diversas formas de conceber o mundo, de problematizá-lo, de vivê-lo, de solucioná-lo, iremos entender que a realidade de nossas vidas é só uma forma de perceber o mundo, em meio a tantas outras que existem. Assim poderemos nos emancipar da importância dada pelos padres a certos conhecimentos, pois a única coisa realmente importante são as pessoas e todas as outras coisas tem a importância que nós darmos a elas.
Um abraço forte e apertado,
Luan Menezes

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