UMA ASSISTÊNCIA NECESSÁRIA

Imagens: Marcelo Bertoli


            "Realizei o estágio de vivência em saúde da família e comunidade entre os dias 10 e 21 de Dezembro de 2018, no Bairro Cidade de Águeda. Durante este período, pude entrar em contato com várias das atividades propostas pela Unidade Básica de Saúde da Família, com o dia-a-dia dos trabalhadores da unidade e descobrir não apenas o funcionamento de uma UBSF, mas também a importância que este serviço tem para sua comunidade.
            Desde o primeiro dia, comecei a atender pacientes no acolhimento, o que se revelou uma agradável surpresa, já que a cadeira de Clínica Médica, que concluí esse ano, não me preparou para as demandas que encontrei ali. Tive a oportunidade de receber pacientes cujas queixas eram as mais variadas e que, por não serem consultas pré-marcadas, envolviam condutas que nunca tinha visto serem prescritas, mesmo após um ano de clínica -como receitas de antibióticos, encaminhamentos para a emergência de hospitais, testes rápidos de HIV, sífilis, hepatites.
            Mesmo com uma grande demanda de acolhimentos, a UBSF permitiu que acompanhássemos grupos especiais em que médicos, agentes comunitários, profissionais da enfermagem e de outras áreas aconselhavam e realizavam dinâmicas com o objetivo de orientar gestantes, pessoas com diabetes, hipertensão arterial. Foi através de experiências assim que pude ver que a saúde não é promovida apenas dentro de um consultório ou de um hospital. Membros da comunidade recebiam conselhos sobre alimentação saudável, prática de atividades físicas e podiam compartilhar suas dúvidas com profissionais da saúde e outras pessoas em condições parecidas.
            A imersão no cotidiano da unidade trouxe, além das experiências profissionais, a oportunidade de entrar em contato pessoal com todos que estão envolvidos no serviço. Pude fazer amizade com todos os trabalhadores -tanto da área da saúde, como da limpeza, segurança, recepção-, conhecendo suas responsabilidades e a importância que eles tem para o funcionamento de uma UBSF. Em mais de um momento, eles sentaram para conversar conosco (estagiários da Vivência) e compartilharam seus pensamentos e pontos de vista sobre o que acontece diariamente no posto.

Para mim, a experiência mais enriquecedora foi acompanhar o encontro do NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da Família). Nas duas reuniões que acompanhamos, foram discutidos casos de pessoas da comunidade com necessidades que vão além daquelas que podem ser supridas pela ação do médico e da enfermagem, como problemas nutricionais, psicológicos, psiquiátricos, recuperação física e fragilidade social. Esse núcleo me fez perceber o tamanho do impacto que a atenção primária pode ter dentro do sistema de saúde e a importância da presença de diversas áreas nesse apoio à saúde da família, contribuindo para diminuir o número de usuários que buscam hospitais e poderiam ter suas demandas resolvidas por esses profissionais.
            Durante o período do estágio, tivemos apenas 1 oportunidade de fazer a visita domiciliar -devido à chuva-, mesmo assim, a experiência foi muito interessante. Não apenas pela relevância dessa atividade na vida de pessoas impossibilitadas de se deslocar até o posto de saúde, mas pela oportunidade de ver como o serviço desse posto pode ser levado até a pessoa. Acompanhamos a médica e a técnica de enfermagem da unidade atenderem um senhor que teve um acidente vascular encefálico, há alguns anos, e agora pode ter tido outro, pelo que foi descrito por seus familiares. Auxiliamos na investigação e no pedido de exames para identificar o motivo das queixas.


         Os maiores aprendizados, com certeza, não foram em relação a como ser um médico melhor, mas sim, a como ser um ser humano melhor. Ter contato com as pessoas, de um lado e, de outro, com um serviço tão humano e verdadeiro como o da atenção básica de saúde me permitiu compreender melhor as complexidades dessa relação que existe entre o paciente e o serviço de saúde. Pude compreender as dificuldades que os profissionais, não apenas os médicos, encontram ao cumprir suas funções dentro de um sistema que parece, às vezes, esquecê-los. E também pude perceber melhor a realidade de uma população que, se não recebesse a assistência de uma UBSF, como a da Cidade de Águeda, estaria à margem da sociedade e, no fim das contas, ajudaria a lotar os corredores de hospitais com problemas que poderiam ter sido evitados antes de se instalarem.
            Minha conclusão é que o estágio de Vivências é uma forma muito eficiente de permitir que o estudante se aprofunde no conhecimento, tanto do sistema de saúde, como das pessoas e profissionais que fazem parte deste sistema. Algo que as cadeiras da faculdade, em sua maioria, falham em trazer para o aluno, mas que é de extrema importância para sua formação."

Marcelo Bertoli é acadêmico do curso de medicina da FURG, em Rio Grande/RS, e participou das vivências em MFC da LES em Dezembro de 2018. Além de colecionar quadrinhos, nas horas vagas ele gosta de jogar RPG e assistir filmes de terror. Uma vez ao ano, Marcelo é jogador de futebol.

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